Terapia pode tratar quadros depressivos com eficácia e é tão segura quanto as drogas antidepressivas usadas com a psicoterapia, descobriu uma nova análise.
Nicholas Bakalar, do New York Times
20/09/2021 - 18:35 / Atualizado em 20/09/2021 - 20:14
A eletroconvulsoterapia, ou ECT, pode ser eficaz para o tratamento da depressão grave e é tão segura quanto o uso combinado de drogas antidepressivas e a psicoterapia, concluiu um novo e amplo estudo.
O procedimento, antes conhecido como "terapia de eletrochoque", tem uma história controversa e amplamente desfavorável. Isso se deve em parte a representações imprecisas em livros e filmes populares, como "Um estranho no ninho" (filme dos anos 1970 dirigido por Milos Forman com Jack Nicholson no elenco), e em parte a consequências de problemas reais com as primeiras versões do procedimento, que usavam fortes correntes elétricas e nenhuma anestesia.
Hoje, a ECT é realizada sob anestesia geral, e o médico, trabalhando ao lado de um anestesiologista e de uma enfermeira, aplica uma corrente elétrica fraca no cérebro (geralmente cerca de 0,8 amperes a 120 volts) durante um tempo que varia de um a seis segundos. Isso causa uma convulsão dentro do cérebro, mas, por causa da anestesia, o paciente não sente contrações musculares. A convulsão leva a alterações cerebrais que aliviam os sintomas da depressão e de algumas outras doenças mentais. Normalmente, os médicos administram uma série de sessões de ECT por um período de dias ou semanas.
A única parte dolorosa do procedimento é a inserção de uma linha intravenosa antes da anestesia. Pode haver efeitos colaterais posteriores, incluindo a perda temporária de memória, confusão ou dores de cabeça e dores musculares transitórias. Médicos discutem se a ECT pode causar problemas de memória de longo prazo distintos dos problemas de memória que podem ser causados pela própria depressão.
Estudo 'interessante e bem realizado'
Para este novo estudo, publicado na Lancet Psychiatry, pesquisadores canadenses usaram os registros de 10.016 adultos cuja depressão foi grave o suficiente para passar três ou mais dias no hospital. Metade deles recebeu ECT, enquanto a outra metade foi tratada com medicamentos e psicoterapia. A idade média deles era 57 anos, e cerca de dois terços eram mulheres. Os pesquisadores acompanharam como cada grupo se saiu nos 30 dias após a alta do hospital.
O estudo do tipo caso-controle observou no grupo analisado mais de 75 fatores, incluindo características sociodemográficas, uso de medicamentos, outras doenças médicas, estado comportamental e cognitivo e o uso de serviços psiquiátricos e outros de saúde. Esta metodologia completa ajudou a superar algumas das limitações de pesquisas anteriores.
A ECT não parece aumentar o risco de problemas médicos sérios, o que inclui doenças circulatórias, respiratórias ou geniturinárias que exigem internação hospitalar nem mortes que não sejam resultado de suicídio. Nos 30 dias após a alta, 105 dos pacientes com ECT tiveram um problema médico sério, em comparação com 135 entre os do grupo controle, uma diferença estatisticamente insignificante. Os pesquisadores não rastrearam problemas médicos menores tratados em ambulatórios. Suicídios foram raros em ambos os grupos, mas foram significativamente menores naqueles tratados com ECT.
— Este é um estudo interessante e bem realizado. Como a ECT é cercada por muitas opiniões negativas, precisamos de toda a ajuda que pudermos obter de pesquisas da vida real — disse Martin Balslev Jorgensen, professor de psiquiatria da Universidade de Copenhagen e amplo pesquisador da ECT, mas que não esteve envolvido neste estudo.
Jacob P. Feigal, diretor médico do programa de ECT da Universidade Duke, que também não participou do trabalho, disse que o estudo pode ser útil para conversar com pessoas para as quais o melhor tratamento é a ECT, mas que temem complicações.
— Como médico, isso me ajuda a estruturar o argumento. Contribui com um elemento realmente importante para a discussão sobre o risco de fazer ECT em comparação com o risco de não fazê-la em pessoas com depressão grave — disse ele.
Para Jorgensen, o novo estudo mostra que os pacientes não precisam se preocupar com complicações médicas e que podem se concentrar nos problemas reais da ECT: o fato deque você precisa ser anestesiado e que, após vários tratamentos, você pode ter alguma perda de memória no período que antecede e durante a ECT.
Professor de psiquiatria e diretor do programa de estimulação cerebral da Universidade Johns Hopkins. Irving M. Reti, que não esteve envolvido no relatório, disse que é "um estudo importante e substancial" que acrescenta à literatura ao mostrar que a ECT é segura.
— Isso a coloca em um contexto médico: milhares de pacientes sem complicações médicas significativas.
Principal autor do estudo, Tyler S. Kaster, bolsista do programa de estimulação cerebral da Universidade de Toronto, no Canadá, concordou que a ECT tem riscos, mas, reforça, o mesmo acontece com a depressão grave, que pode levar a problemas sérios, entre eles doenças cardiovasculares, demência, uso de substâncias e suicídio.
Decidir submeter-se à ECT é uma “decisão complexa e séria”, disse ele, que conclui:
— A esperança neste estudo é que ele forneça informações importantes que permitam aos pacientes, seus familiares e seus médicos compreenderem os riscos e tomar uma decisão com a qual se sintam confortáveis.
コメント